Correio Braziliense
- 17/06/2017
Ministro Walton Rodrigues critica a postura das companhias
que tratam os supersalários como um "segredo guardado a sete chaves"
O Tribunal de Contas da União (TCU) considera escandalosos
os argumentos dos ministérios do Planejamento e de Minas e Energia, que alegam
não ser "conveniente" o exame da remuneração paga a seu pessoal
cedido pela Eletrobras por receberem "muito acima" do teto do serviço
público. Em comunicado ao plenário da Corte, no qual propõe a abertura de
auditoria nas folhas de pagamentos das estatais, o ministro Walton Alencar
Rodrigues classificou os supersalários nas empresas públicas como uma violação
"evidente e patente" do princípio da moralidade.
"No Brasil, todos os dados atinentes aos salários pagos
pelas estatais aos seus empregados constituem segredo guardado a sete chaves.
Seu conhecimento é motivo de escândalo. Trato das estatais que não dependem de
recursos do Tesouro e fixam os salários do seu pessoal de forma absolutamente
descontrolada e à margem de qualquer parâmetro social ou empresarial",
explicou, no documento. O ministro citou especificamente o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no qual, segundo ele, 5 mil
empregados recebem 16 salários por ano. "Fazem-no em valores que fariam
corar qualquer pessoa dotada de bom senso", afirmou.
Apesar de várias estatais não dependerem do Tesouro,
destacou Rodrigues no comunicado, a União é a maior acionista e, em última
análise, é dinheiro público que custeia os altíssimos salários. "Veja que
não estou a tratar do quadro de dirigentes, mas do empregado normal, integrante
da estrutura de pessoal da estatal. Para mim, a violação do princípio da
moralidade é evidente e patente", ressaltou.
O ministro alertou que, em processo levado à pauta do TCU
pelo ministro Aroldo Cedraz, as pastas do Planejamento e de Minas e Energia
"alegaram não ser conveniente o exame das verbas que são pagas a seu
pessoal cedido da Eletrobras, no respeitante ao teto de remuneração,
permitindo-lhes ganhos muito acima do teto do serviço público. Considero o
argumento escandaloso. Afinal, não há conveniência acima da Constituição, que
fixou o teto de remuneração, como princípio geral", explicou.
"Tudo o que disse em relação ao BNDES e aos argumentos
do Planejamento e das Minas e Energia vale também em relação a outras
estatais", acrescentou no texto, em que propõe a verificação da
regularidade das remunerações e pensões pagas, a composição dos salários e a
higidez dos fundos de pensão, em todas as empresas públicas.
"Não faz sentido"
O ministro Bruno Dantas, do TCU, defendeu a iniciativa do
colega. Ele destacou que a medida não visa a aplicação do teto na diretoria das
empresas públicas, mas busca dar maior transparência aos salários de funções
intermediárias, que são acima do limite constitucional. "Se houver
divulgação, normalmente, o padrão poderá ser o teto de mercado, que é até menor
do que o do funcionalismo, porque não faz sentido auxiliar administrativo ganhar
R$ 40 mil", explicou Dantas.
Para o especialista em contas públicas José Matias-Pereira,
professor da Universidade de Brasília (UnB), o teto constitucional deve ser
respeitado na administração direta e indireta e nas estatais, principalmente
nas que dependem do Tesouro Nacional. "Elas têm que se ajustar às normas
constitucionais. O problema é que as estatais não costumam ter o compromisso de
prestar contas", avaliou.
Matias-Pereira, que dá aulas de administração pública na
UnB, afirmou que o processo do TCU chegou tarde demais e os prejuízos causados
pela falta de cumprimento da Constituição se acumularam. "O corporativismo
e o patrimonialismo fazem com que as decisões do STF (Supremo Tribunal Federal)
cheguem diluídas na ponta, assim, as empresas encontram mecanismos para se
afastar das obrigações e burlar a lei", disse. O especialista ressaltou
que os órgãos de controle têm papel fundamental no processo de garantir o
cumprimento das normas, mas acabam se distanciando do que deveriam fazer por
conta da sua fragilidade. "As cúpulas desses órgãos são indicações
políticas."
O Ministério do Planejamento informou, por meio da
assessoria de imprensa, que, "em nenhum momento, alegou não ser
conveniente o exame de verbas pagas aos servidores cedidos pela Eletrobras".
O Ministério de Minas e Energia disse que atenderá as recomendações do Tribunal
de Contas da União. "As medidas serão implementadas conforme orientações
do Ministério do Planejamento, órgão responsável pelo assunto", afirmou,
em nota.
O BNDES explicou que a aplicação do teto aos empregados das
empresas públicas e das sociedades de economia mista "está expressamente
limitada aos casos em que tais empresas recebam recursos da Fazenda".
"Considerando que o BNDES não recebe recursos financeiros da União para
pagamento de despesas com pessoal ou de custeio em geral, é inaplicável o teto
à instituição", ressaltou, em nota. "Adicionalmente, informamos que o
corpo funcional é formado por 2.808 empregados. O BNDES estará à inteira
disposição do TCU para prestar todos os esclarecimentos que se fizerem
necessários."
(Simone Kafruni , Rosana Hessel)