STF - 24/10/2011
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal,
reconheceu a atribuição do Ministério Público do Rio de Janeiro para apurar
irregularidades que teriam sido praticadas por uma servidora pública federal
cedida ao Município do Rio de Janeiro para ocupar a função de assessora no
gabinete da Secretaria Municipal de Cultura. A decisão foi tomada em Ação Cível
Originária (ACO 1143) em que o procurador-geral da República suscitou conflito
negativo de atribuição entre os dois órgãos do Ministério Público. “No âmbito
civil, o STF utiliza a titularidade do patrimônio lesado como norte para a
fixação das atribuições do Ministério Público Federal ou do Estadual”, assinalou
o ministro Gilmar Mendes.
O inquérito civil para apurar as irregularidades foi
instaurado pelo MP do Rio de Janeiro a partir de representação feita pelo
promotor estadual titular da 24ª Promotoria de Investigação Penal. No âmbito
criminal, a servidora foi denunciada por supostamente desviar dinheiro
pertencente ao Município do Rio de Janeiro. De acordo com a denúncia penal, ela
teria se utilizado de sua senha pessoal para alterar, de forma irregular, as
informações sobre pagamento de encargos especiais encaminhadas ao órgão
responsável pela folha de pagamento. Desta forma, teria elevado de forma
fraudulenta sua própria remuneração a título de desempenho administrativo de R$
600 para R$ 2.000 entre setembro e dezembro de 2002.
O MP estadual encaminhou o inquérito ao MP federal por
entender que o dano causado pela servidora ao erário municipal já era objeto de
inscrição na dívida ativa e, consequentemente, de execução fiscal. Para o MP
estadual, a ação de improbidade administrativa deveria ser proposta perante a
Justiça Federal, em vista das sanções previstas na Lei 8.429/1992 em casos de
condenação por improbidade administrativa.
O Ministério Público Federal, porém, não reconheceu sua
atribuição no caso. O fundamento foi o de que o patrimônio atingido pertence ao
Município do Rio de Janeiro. Segundo o MPF, não há qualquer indicação de lesão
aos bens, serviços e interesses da União, e a Justiça Estadual pode determinar,
se for o caso, a perda de cargo federal, como ocorreria em caso de condenação
definitiva por crime sujeito à competência estadual.
Ao decidir, o ministro Gilmar Mendes lembrou que, de acordo
com o artigo 109, inciso I, da Constituição Federal, a Justiça Federal só detém
a competência se a União possuir interesse que lhe permita atuar como autora,
ré, assistente ou oponente. “A conduta supostamente lesiva ao Município do Rio
de Janeiro atingiria a moralidade administrativa na esfera municipal porque,
embora se trate de servidora federal, não se encontrava a serviço da União há
quase uma década, pois estava cedida, desde 1993, ao município”, assinalou.
O relator observou ainda que o inquérito civil e a ação
civil pública por improbidade “são institutos que não se confundem com o
processo administrativo disciplinar”. Ou seja, a pena eventualmente aplicada
nessas situações tem natureza jurídica distinta da sanção administrativa
disciplinar, sendo possível à Justiça Estadual aplicar as penas previstas na
Lei 8.429/1992 a servidor público federal que, cedido a ente municipal, tenha
causado dano a seu patrimônio por ato de improbidade.