A idéia de valorizar as carreiras responsáveis pela
prestação de serviços que só o Estado pode realizar nunca foi uma prioridade
dos governos, considerando o histórico de desrespeito aos servidores e do
sucateamento a que o serviço público foi submetido, de um modo geral, e as
carreiras exclusivas de Estado, em particular.
Apenas a título de ilustração, basta dizer que somente
durante os governos Collor e FHC, por exemplo, pelo menos 50 direitos,
vantagens ou benefícios dos servidores foram suprimidos, tanto em nível
infraconstitucional quanto na esfera constitucional, sempre sob o pretexto de
promover ajuste fiscal pelo lado da despesa.
Naquele período, o desmonte do Estado foi proposital. Houve
a desativação de órgãos; servidores foram colocados em disponibilidade com
remuneração proporcional ao tempo de serviço; aconteceram demissões em massa; a
terceirização foi quase que generalizada; direitos foram reduzidos ou
suprimidos; não houve reposição salarial equivalente à perda inflacionária;
houve perseguição a servidores que militavam nos sindicatos ou nos partidos
políticos; além da completa ausência de diálogo e de respeito às entidades
representativas dos servidores públicos.
Esse foi um tempo de triste memória para os servidores
públicos.
Em que pese reconhecer que o governo do ex-presidente Lula
promoveu uma mudança cultural nas relações de trabalho no serviço público, com
a substituição de um padrão autoritário por um sistema de diálogo, os
servidores continuaram sendo utilizados como principal variável de ajuste
fiscal, pelo menos nos dois primeiros anos de mandato, quando o mercado
financeiro dava as cartas.
O próprio presidente Lula, no primeiro ano de seu mandato,
patrocinou uma reforma previdenciária que marcou negativamente a relação de seu
governo com os servidores, ao patrocinar: 1) a instituição da contribuição de
aposentados e pensionistas, 2) o redutor da pensão, e 3) a quebra da paridade
entre ativos e aposentados.
Entretanto, apesar de ter mantido uma política de
gratificação diferenciada, como faziam os governos anteriores, a partir do
terceiro ano de seu mandato tomou uma série de medidas e iniciativos que
sinalizavam para a recuperação do aparelho de Estado, com a realização de
concursos públicos para reposição de quadros, reestruturação de carreiras e
cargos, e instituição de instâncias de diálogo e negociação.
No governo Dilma, que teve como principal retrocesso a
adoção da previdência complementar, consolidando a quebra da paridade e
integralidade, também não foi adotada uma política salarial, nem mesmo houve
reposição da inflação passada, tendo havido apenas acordo para um reajuste, em
três parcelas, que sequer cobrirá a inflação dos anos de sua vigência (2013 a
2015).
Assim, qualquer política de valorização do servidor público
deve começar pela adoção de uma política salarial que atualize e preserve o
poder de compra dos salários. Sem essa medida, não existe compromisso sério de
respeito e resgate da dignidade do servidor.
Aliás, se os governos cumprissem pelo menos o comando
constitucional (artigo 37, inciso X) e legal (Lei 10.331/2001), que asseguram,
respectivamente, a revisão geral e a data-base para o reajuste salarial dos
servidores no mês de janeiro de cada ano, repondo o poder de compra dos
salários, já seria um passo importante.
Atualmente, se o Poder Executivo, por qualquer razão, não
alocar os recursos para o reajuste de pessoal nem encaminhar o projeto de lei
prevendo o reajuste e o respectivo montante de recursos na Proposta
Orçamentária, os servidores ficam sem revisão geral, como tem ocorrido
reiteradamente nos últimos anos.
Assim, a primeira medida deveria consistir na reposição da
inflação passada, e, uma vez recompostos os salários, implementar e garantir a
revisão-geral anual, no mínimo no mesmo patamar de correção dos benefícios
previdenciários do INSS, para todos os servidores ativos, aposentados e
pensionistas, como já ocorre em relação aos aposentados e pensionistas sem
direito à paridade, conforme assegurado na Lei 11.784/2008.
O segundo passo, além de ampliar e fortalecer a
meritocracia, com a redução drástica de cargos de livre provimento, seria
regulamentar a Convenção 151 da OIT, para permitir a negociação de
reestruturação salarial (não reposição, que deve estar prevista na lei) e
melhoria de condições de trabalho, entre outras reivindicações gerais e
específicas dos servidores.
A terceira medida passaria pelo restabelecimento do
adicional por tempo de serviço, um diferencial remuneratório ou um prêmio pela
dedicação ao serviço público, além do pagamento de indenização pela lotação em
lugar inóspito, como as regiões de fronteira.
A quarta, não necessariamente nesta ordem, passa pela
necessidade de se aprovar leis orgânicas específicas para as carreiras de
Estado (exemplo: grupo fisco, carreiras jurídicas, de segurança, ciclo
financeiro, etc), nas quais estejam asseguradas as prerrogativas e atribuições
dos cargos, cuja participação deverá ser obrigatória na formulação, na
arrecadação ou na fiscalização de aplicação de recursos públicos, entre outras
atividades exclusivas de Estado.
A quinta passaria pela isonomia remuneratória de carreiras
cuja natureza, grau de responsabilidade, complexidade, requisitos para
investidura e peculiaridade dos cargos se equivalem, com a aprovação das PECs
com essa finalidade em tramitação na Câmara.
A sexta, também por isonomia, passaria pela uniformização
dos valores das verbas indenitárias de transporte, habitação, alimentação,
saúde, entre outros, afinal de contas não faz sentido ter valores distintos por
Poder, por cargo ou por qualquer outra razão, já que as indenizações devem ser
impessoais e independente do status do servidor, se servente ou magistrado.
Em sétimo lugar, para ficar apenas em sete exemplos, as
carreiras de Estado deveriam contar com suporte – humano, material e logístico
– para o bom desempenho de sua missão, que consiste, em última instância, na
garantia de governabilidade (definida como o aumento da capacidade do governo
em intermediar interesses, garantir legitimidade e governar) e, principalmente,
na governança (definida como a capacidade financeira e administrativa de
implementar as decisões políticas tomadas pelo governo).
Essencialmente, são essas as medidas, ações ou providências
que garantiriam respeito e dignidade dos servidores em geral e das carreiras
exclusiva de Estado em particular. As carreiras de Estado são as que dispõem do
poder de regulamentar, fiscalizar, fomentar, cobrar e fiscalizar tributos, o
poder de polícia e a prestação de serviços previdenciários, entre outros,
motivo pelos quais devem ter, também, o apoio indispensável para bem executar
suas tarefas e atribuições.
Fonte: DIAP
Antônio Augusto de Queiroz: Jornalista, analista político e diretor de
Documentação do Diap
Acompanhe o noticiário de Servidor público pelo Twitter
Acompanhe o noticiário de Servidor público pelo Twitter