O Estado de S. Paulo
- 09/10/2012
Alegando que o Palácio do Planalto não atende a suas
reivindicações salariais e que a sociedade os vem tratando com descaso, juízes
e desembargadores da Justiça Federal realizaram uma assembleia-geral
extraordinária, na primeira semana de outubro, e decidiram fazer uma greve por
tempo determinado, entre 21 e 22 de novembro, cancelando a tomada de
depoimentos e suspendendo as audiências já marcadas para esses dois dias.
Apenas pedidos urgentes de liminares serão examinados.
Alguns juízes e desembargadores federais propuseram que a
greve fosse por tempo indeterminado, mas os líderes da corporação defenderam um
"protesto amigável". Segundo eles, o objetivo da greve é chamar a
atenção para a situação salarial da magistratura, exigir "tratamento mais
adequado" da parte dos poderes públicos e pressionar a presidente Dilma
Rousseff a atender às demandas da categoria.
Além disso, a entidade que representa a categoria - a
Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) - anunciou que seus filiados,
por terem entrado em "estado de mobilização", não participarão da 7.ª
Semana de Conciliação, que ocorrerá entre os dias 7 e 14 de novembro.
Organizada sob a forma de um mutirão de alcance nacional, integrado por juízes
estaduais, federais e trabalhistas, essa é uma das mais importantes iniciativas
que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vem tomando desde sua instalação, em
2006, para descongestionar a primeira e a segunda instâncias do Poder
Judiciário.
O evento do ano passado contou com a participação de 53
tribunais e, das 339 mil audiências de conciliação realizadas, 164 mil
resultaram em acordos homologados pela Justiça, no valor total de R$ 1,1
bilhão. Só os cinco Tribunais Regionais Federais (TRFs) realizaram cerca de
23,6 mil audiências de conciliação, das quais 16,3 mil resultaram em acordo,
encerrando os processos em caráter definitivo.
"Juízes e desembargadores federais estão desanimados e
insatisfeitos. Eles assumem funções extraordinárias sem reconhecimento e sem
remuneração extra, diz o presidente da Ajufe, Nino Oliveira Toldo. A categoria
reivindica um aumento de 28,82% - o porcentual que considera
"essencial" para a recomposição dos vencimentos. E, invocando o velho
argumento da isonomia, também pleiteia a implantação do adicional por tempo de
serviço e do "alinhamento salarial" com os membros do Ministério
Público da União e com algumas carreiras das Justiças Estaduais.
No último acordo feito com os dirigentes do Poder
Judiciário, a equipe econômica do governo se comprometeu a reajustar os
salários dos juízes e desembargadores federais em 15,8%, divididos em três
parcelas. Para a direção da Ajufe, isso não cobre as perdas inflacionárias dos
últimos anos e não leva em conta as "características peculiares da
magistratura". Segundo a entidade, a inflação dos últimos cinco anos
superou 40% e o último reajuste da corporação, concedido há três anos, foi de
9%.
Reivindicando um aumento de 56% em novembro do ano passado,
a magistratura federal ameaçou entrar em greve e promover uma operação-padrão
nas ações judiciais em que a União era parte, em novembro de 2011. Na ocasião,
a equipe econômica do governo classificou a ameaça como chantagem. Afirmou que
as pretensões salariais da categoria eram "delirantes". E alegou que,
apesar de os Poderes serem independentes, "o cofre é um só e a
responsabilidade sobre o que entra e sai é do Executivo". Por seu lado, as
autoridades responsáveis pela elaboração do Orçamento da União lembraram que os
tribunais já pagam os maiores salários de todo o funcionalismo público do País.
E mostraram, com base num estudo do CNJ, que a Justiça é uma instituição
"inchada" - ou seja, com um número de funcionários bem maior do que o
necessário. Com 91 tribunais, o Judiciário tem 312,5 mil servidores e 16,1 mil
juízes - e os gastos com salários totalizaram R$ 37 bilhões, em 2009.
Como até hoje não há uma lei que discipline a política
salarial do funcionalismo e o direito de greve no serviço público continua sem
regulamentação, as corporações que gritam mais quase sempre conseguem o que
reivindicam. É isso que explica a nova ameaça de greve da Ajufe.