domingo, 7 de abril de 2013

Vitória da transparência


Leandro  Kleber
Correio Braziliense     -     07/04/2013




Servidora do Senado que acusou de "bisbilhoteiro" cidadão que checou salário dela é condenada pela Justiça a fazer doação a entidade assistencial

A divulgação dos salários dos servidores públicos na internet, determinação imposta pela Lei de Acesso à Informação desde maio do ano passado, teve mais um capítulo judicial na última semana — com direito a vitória da transparência e da cidadania. Além das denúncias anônimas que chegaram à Controladoria-Geral da União (CGU), de suposto enriquecimento ilícito de servidores públicos federais, feitas graças à publicação online dos contracheques, agora uma decisão na Justiça deu voz a um cidadão que acessou o salário de uma servidora do Senado e foi ofendido por ela na sequência. 

A funcionária da Casa Legislativa só soube quem acessou os seus dados porque o site do órgão exige o preenchimento de um cadastro por parte do interessado. Assim, na intranet da instituição, o funcionário consegue visualizar o nome, o CPF, o e-mail e o endereço do cidadão que fez a consulta — o mesmo ocorre na Câmara. Um dia depois de ter o vencimento acessado, a funcionária entrou em contato com o cidadão que fez a consulta por e-mail — conforme o Correio mostrou em outubro do ano passado — e o chamou de bisbilhoteiro.

Weslei Machado, servidor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi quem consultou a remuneração da servidora do Senado e se sentiu ofendido. Ele entrou com duas ações 11 dias depois de ter travado uma discussão por e-mail. Uma ação cível de caráter indenizatório, por danos morais, e uma criminal por injúria, que previa pena de 1 a 6 meses de detenção. Na segunda audiência de conciliação, realizada na última segunda-feira, já que na primeira não houve acordo, Machado propôs que a funcionária doasse 10% do salário para uma entidade de caridade, medida que ela aceitou depois de consultar o advogado. Assim, os dois processos foram arquivados. Procurada pela reportagem, ela disse que não comentaria o caso.

De acordo com Machado, durante a audiência, a servidora do Senado chorou depois de ter aceitado a proposta, mas não disse qualquer palavra.

Quem falava por ela era o advogado, “educado e pacífico”, segundo Machado. A expectativa do funcionário do TSE é que a medida cause efeito prático devido ao caráter educativo que a ação pode provocar. “Creio que serve como uma prevenção geral, com poder educativo a todos. Há ainda uma questão pedagógica para aqueles que conhecerem a história pensarem duas vezes antes de ofender alguém. Temos de respeitar alguns valores que o país tem”, acredita.

Pelo acordo, a taquígrafa do Senado terá de desembolsar, em no máximo 60 dias, pouco mais de R$ 1,5 mil para comprar bens de natureza diversa ao Serviço de Estudos e Atenção a Usuários de Álcool e outras Drogas do Hospital Universitário de Brasília (HUB). A servidora terá de entrar em contato previamente com a instituição para verificar quais os itens que deverão ser doados.

“Eu não queria o dinheiro. Mesmo que ela fosse condenada a pagar, eu o doaria. Na época, queria olhar a remuneração de um analista e o nome dela chamou a minha atenção. Fiquei perplexo com a conduta dela depois do último e-mail que encaminhei, porque houve restrição ao direito de liberdade de expressão e porque ela integra o Senado, que aprovou a lei (de Acesso à Informação)”, conta. Machado acha que ela reconheceu o erro ao aceitar o acordo. Evangélico, casado e pais de duas filhas, ele atua ainda como professor de direito constitucional e eleitoral e já publicou 14 livros sobre o assunto.

E-mail

No dia 4 de outubro do ano passado, a servidora do Senado encaminhou um e-mail para ele questionando se havia interesse público saber quanto ela ganhava e chamando a atitude de “bisbilhotice”. Minutos depois, Weslei respondeu o e-mail argumentando que a Lei de Acesso à Informação garantia o direito de fiscalizar, como cidadão, o contracheque dos servidores públicos. Em seguida, a servidora do Senado chamou-o de “fofoqueiro” e “bisbilhoteiro”. Em menos 20 minutos, Weslei respondeu de novo, “exigindo respeito e urbanidade no tratamento”. Disse que apenas estava exercendo um direito conferido por uma lei elaborada pelo próprio parlamento ao “qual você integra”.

Machado ainda ressaltou que o demonstrativo é público e que ele contribui para o pagamento da remuneração. “Com o meu suor e do resto da sociedade brasileira, bancamos a manutenção de seu status remuneratório. Por essa razão, tenho direito de fiscalizar e acompanhar mensalmente a correição dos recursos públicos destinados a V. Sra.”, escreveu no e-mail.

Portais dão acesso à informação

O que a Lei permite ao cidadão?

- A lei, sancionada em novembro de 2011 e regulamentada em maio do ano passado, obriga os órgãos públicos a divulgar os salários dos servidores na internet. Qualquer cidadão pode consultar a remuneração dos funcionários públicos por meio do Portal da Transparência, site que disponibiliza os dados de quase 1 milhão de servidores ativos e aposentados do Executivo, e nas páginas das instituições dos demais poderes. Além disso, a lei determina que as entidades têm de prestar qualquer tipo de informação solicitada pelo cidadão em, no máximo, 30 dias — exceto em casos de dados pessoais e informações classificadas como sigilosas.

Que tipo de informação é acessível?

- Além dos salários e das remunerações eventuais (como gratificação, férias etc.), o cidadão tem acesso ao cargo de qualquer funcionário público. No Portal da Transparência, ainda é possível ver quando o servidor tomou posse.

Como o cidadão pode acessar os salários?

- Basta entrar no Portal da Transparência e clicar em “servidores” para ter acesso à remuneração dos funcionários do Poder Executivo, incluindo o contracheque da presidente da República e ministros de Estado. No Legislativo, Câmara, Senado e Tribunal de Contas da União (TCU) disponibilizam os vencimentos de seus funcionários nas suas páginas eletrônicas, assim como as instituições do Judiciário, incluindo o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça

O que devo informar?

- Nos sites dos órgãos do Judiciário e na página do Executivo (Portal da Transparência), o cidadão não precisa fornecer nenhum dado pessoal para ter acesso às remunerações dos servidores — o mesmo ocorre com o site do TCU, do Legislativo. Porém, no Congresso Nacional, a situação é diferente. As páginas eletrônicas da Câmara e do Senado obrigam o cidadão que deseja consultar a remuneração de algum funcionário a preencher um cadastro informando o nome completo, CPF, endereço, CEP e e-mail. O cadastro tem de ser preenchido sempre que um nome for consultado.

Alguns sites que divulgam os salários dos servidores:

Portal da Transparência www.portaldatransparencia.gov.br

Câmara http://www2.camara.leg.br/transpnet/consulta

Senado http://www.senado.gov.br/transparencia/servidores/consulta_individual.asp

STF http://www.stf.jus.br/portal/remuneracao/pesquisarRemuneracao.asp

STJ http://www.stj.jus.br/webstj/transparencia

Acompanhe o noticiário de Servidor público peloTwitter


Share This

Pellentesque vitae lectus in mauris sollicitudin ornare sit amet eget ligula. Donec pharetra, arcu eu consectetur semper, est nulla sodales risus, vel efficitur orci justo quis tellus. Phasellus sit amet est pharetra