Valor Econômico - 17/10/2011
Como ocorre todos os anos, há uma onda de movimentos
grevistas protagonizada por servidores públicos e funcionários de empresas
estatais. A mais ruidosa desta vez foi, sem dúvida, a dos empregados da Empresa
de Correios e Telégrafos (ECT), que pararam por 28 dias. Segundo estimativa da
direção da empresa, a greve provocou prejuízo de pelo menos R$ 200 milhões à
estatal.
Essa perda reflete somente o custo imposto aos cofres
públicos, uma vez que a ECT tem apenas um dono - o Tesouro. A sociedade arcou
com um prejuízo difícil de calcular, mas que certamente contribuiu para o
aumento da ineficiência da economia.
Outra categoria, a dos servidores e funcionários dos
institutos de educação básica, profissional e técnica, está paralisada desde 1º
de agosto. Nas últimas semanas, além da greve dos Correios, houve paralisações
na Eletrobrás e na Embrapa, em bancos e universidades federais. Há ameaças de
suspensão do trabalho na Petrobras, na Infraero e na Polícia Federal.
Quando uma greve dura mais de dois meses, como a da
educação, é o caso de se perguntar: se um serviço público fica sem funcionar
durante tanto tempo, qual é a sua utilidade para a sociedade? A educação é um
serviço essencial e deveria ser tratado como tal, mas, na prática, não é assim.
Uma tradição perversa brasileira ensina que greves nessa área duram sempre
muito mais tempo que nas outras. As greves de professores e funcionários de
universidades federais, que frustram jovens estudantes de todo o país que
ingressam no ensino superior cheios de disposição, constituem um drama à parte,
que merece a atenção das autoridades.
Os governantes se mobilizam para abreviar movimentos de
paralisação na Petrobras ou no Banco do Brasil, mas não têm a mesma presteza em
relação aos da educação. Isso indica claramente quais são as prioridades de
Brasília. Esse aspecto só torna mais urgente a necessidade de o governo propor
ao Congresso a regulamentação do direito de greve dos funcionários públicos.
Quando era sindicalista, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva costumava dizer que greve sem corte de ponto é férias. Como líder dos
metalúrgicos, Lula sabia que uma greve, embora legítima, tem custos. Quanto
mais longa uma paralisação, maior é a parcela do salário dos grevistas
subtraída por causa dos dias parados. Greve é um recurso radical. Revoltava
Lula saber que, no serviço público, não se corta ponto. Na presidência, ele
ameaçou estender ao funcionalismo as regras a que esteve submetido como sindicalista.
Ficou, no entanto, na promessa.
Em 2007, diante da inexistência de legislação específica, o
Supremo Tribunal Federal (STF) estendeu ao funcionalismo as regras da Lei de
Greve (7.783/89), que rege os trabalhadores do setor privado. Em tese, portanto,
o governo já poderia cortar o ponto de funcionários em greve. Lula não o fez e
a presidente Dilma Rousseff também tem evitado recorrer a esse dispositivo
legal.
Na maioria dos casos, o governo troca o corte de ponto por
horas extras de trabalho. Trata-se de um engodo. Afinal, quem garante que as
horas paralisadas serão repostas? Quem fiscaliza? Os grevistas? As informações
vindas dos órgãos públicos dão conta de que não há reposição alguma e fica tudo
por isso mesmo.
Na semana passada, o Tribunal Superior do Trabalho (TST)
decidiu que os empregados da ECT terão que repor, por meio de horas extras, 21
dos 28 dias parados. O tribunal manteve o corte de ponto dos outros sete dias,
mas, numa decisão polêmica, considerou a greve não abusiva. Os funcionários
conseguiram o que queriam e ainda receberam anistia por 21 dias parados.
Não há justificativa para dar tratamento diferenciado aos
funcionários públicos. As regras deveriam ser até mais duras nos casos de greve
em serviços essenciais, típicos do setor público. Ao contrário do trabalhador
do setor privado, o servidor tem garantias e privilégios incomparáveis, como
aposentadoria integral e estabilidade.
E há uma questão de segurança a ser considerada nos serviços
essenciais. Petrobras, Infraero e ECT são empresas monopolistas. No caso de
paralisação, compromete-se o funcionamento do país, com custos incalculáveis
para toda a população. Outro caso é o das polícias. A lei deveria coibir a
greve em serviços públicos em que atuam grupos armados que têm o monopólio da
segurança, como faz a Constituição com os militares.