Correio Braziliense
- 06/02/2018
O enxugamento do quadro de funcionários é um assunto
polêmico na administração pública. O governo pretende retomar um programa de
desligamento voluntário (PDV) - proposta enviada pelo Ministério do
Planejamento à Casa Civil. O problema é que, mesmo com incentivos para a
adesão, apontam especialistas, há risco de reversão da saída mais tarde,
gerando grande incerteza jurídica e fiscal. Nos anos 1990, durante o governo do
presidente Fernando Collor, deixaram o governo 100 mil funcionários. Desses,
12.336 já reingressaram no serviço público, em diferentes condições. Alguns
estão incluídos no Regime Jurídico Único (RJU), com todos os direitos de um
servidor. Outros são submetidos à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
"Os anistiados são, geralmente, de faixa etária
superior a 50 anos e que ficaram muito tempo sem emprego e remuneração. Há
casos isolados de pessoas com idade próxima a 80 anos que também tem
expectativa de reingresso", afirmou o Ministério do Planejamento por meio
de nota. Segundo o especialista em contas públicas Gil Castello Branco,
Secretário-Geral da Associação Contas Abertas, os programas de desligamentos de
servidores, em diferentes gestões, pecam pela falta de critérios e de cuidados.
"Todos têm em comum o fracasso e a ânsia de satisfação ao mercado quanto à
redução da máquina", disse Castello Branco. "São medidas apenas com o
intuito de fazer caixa. Não levam em conta a conjuntura econômica, a perda de
renda e o preparo psicológico para a aposentadoria", lembrou.
Segundo Othon Pereira Neves, secretário-geral do Sindicato
dos Servidores Públicos Federais no DF (Sindsep-DF), nos desligamentos do
governo Collor houve grande pressão da administração pública para que as
pessoas pedissem voluntariamente para sair. "Houve assédio moral, além de
promessas de vantagens financeiras, treinamento, capacitação e liberação de
linhas de créditos para que se tornassem empreendedores. Mas quase nada foi
cumprido", afirmou. "Estima-se que muitos dos 15.629 servidores
levados a aderir ao programa no Distrito Federal faleceram. Restam
desempregados que vivem à margem da sociedade com a perda de planos de saúde e
do vínculo com a Previdência Social. Os mais frágeis psicologicamente
enveredaram para o alcoolismo e drogas", lamentou Othon.
Dos 50 mil funcionários que saíram no governo do presidente
Fernando Henrique Cardoso, nenhum foi reintegrado, segundo Neves, "apesar
de 99% deles terem se arrependido". Ele acha que há grandes chances de
novos programas trazerem prejuízo ao erário. "Isso é uma bola de
neve". Para Luiz Alberto dos Santos, consultor legislativo do Senado e
professor da Fundação Getúlio Vargas (Ebape-FGV), programas de demissão
deveriam ter cláusula de arrependimento. "Basta dizer que, no futuro, o
servidor poderá pedir reingresso, desde que, por exemplo, devolva a
indenização", assinalou o consultor. Segundo ele, isso evitaria conflitos
jurídicos.
O impacto da reestruturação administrativa do governo
Collor, segundo analistas, sequer foi avaliada até o momento pelos órgãos
oficiais. A explicação para a ausência de cálculos para o rombo é o fato de que
as remunerações de anistiados somente têm efeitos financeiros a partir do
retorno ao trabalho. "Equivalem aos salários que recebiam no governo
Collor e, como a maioria ocupa cargos de nível médio, os valores são
relativamente baixos. Não é possível informar a remuneração devido a uma série
de variáveis: isso depende do órgão de lotação, do cargo ocupado e do nível da
função exercida", assinalou o Ministério do Planejamento por meio de nota.
Por Vera Batista