Ana D'angelo
Correio Braziliense
- 02/06/2013
Pelo menos 80 prédios residenciais em Brasília cobram calote
de R$ 5 milhões da União
Taxas de condomínios de apartamentos funcionais não pagas
por servidores que ocupam os imóveis irregularmente
Brasília – A União terá que arcar com uma conta estimada em
cerca de R$ 5 milhões de servidores públicos que ocupam irregularmente imóveis
funcionais e que não pagam sequer a taxa de condomínio devida aos prédios.
Levantamento feito pela reportagem no portal da Justiça Federal no Distrito
Federal revela que pelo menos 80 condomínios de prédios residenciais no Plano
Piloto cobram da União algum tipo de débito de apartamentos funcionais
administrados por diversos órgãos, que vai de R$ 40 mil a mais de R$ 100 mil,
sem contar atualizações monetárias desde o ajuizamento da ação. Alguns dos
processos englobam mais de uma unidade no mesmo bloco.
A Advocacia Geral da União (AGU), por sua vez, move 285
ações judiciais contra servidores públicos por causa desses apartamentos. As
demandas pedem desde a desocupação por aquele que perdeu o direito de ficar
neles a cobranças de débitos referentes às unidades, como os decorrentes de
danos causados ao imóvel e taxas não pagas. Dos atuais 474 imóveis funcionais
administrados pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU), do Ministério do
Planejamento, 59 estão ocupados por servidores que não têm mais direito ao
benefício – desses, 10 já são aposentados e usam os apartamentos há mais de 30
anos, desde a década de 1970. Entre os 364 imóveis sob a gestão do Ministério
da Defesa, seis estão com militares reformados.
Alguns dos processos pedindo a entrega do imóvel correm na
Justiça há mais de 10 anos. Uma das razões é porque o servidor ajuizou uma ação
questionando seu direito de aquisição tão logo a União ingressou na Justiça com
pedido de reintegração de posse, o que acaba suspendendo o processo de despejo.
Esses apartamentos, em geral, de 120 a 200 metros quadrados, têm aluguel mensal
de R$ 3,5 mil a R$ 5,5 mil.
Foi o que aconteceu com um apartamento funcional do Bloco B
da SQN 114 de 180 metros quadrados. Somente depois de 15 anos na Justiça, a AGU
conseguiu finalmente que o tenente-coronel reformado do Exército e médico aposentado
do governo do Distrito Federal Iratan da Silva Rodrigues, de 63 anos, o
entregasse. Do GDF, ele recebe R$ 21,6 mil. O Exército se recusou a informar o
valor da sua aposentadoria, embora o dado seja público. Quem desocupou o
imóvel, que pertence ao Hospital das Forças Armadas (HFA), na semana passada
não foi o servidor: a filha e o genro moravam lá. “Qualquer parente poderia
ocupar o imóvel do qual ele tinha a posse”, justificou o advogado do militar
reformado, Sérgio Araújo de Rezende, seu genro.
No entanto, durante 12 anos, até julho de 2012, quem morou
no apartamento foi um profissional da iniciativa privada sem vínculo com o
serviço público. Isso ocorreu porque o tenente-coronel reformado vendeu, por
meio de contrato de gaveta, o imóvel funcional em 2000, quatro anos após ter
ido para a reserva e perdido o direito de ocupá-lo e dois anos depois de a
União entrar com ação de reintegração de posse. No ano da venda, ele tinha
terminado de construir uma casa num condomínio em Brasília, para onde se mudou.
O comprador foi o corretor de imóveis Alexandre Porto Magno.
O negócio ficou em R$ 60 mil, mediante um sinal de R$ 16 mil. Hoje, o
apartamento é cotado em R$ 1,5 milhão, com aluguel mensal de R$ 4,5 mil e
condomínio de R$ 720. Tão logo a União ingressou com a ação para despejá-lo, o
militar reformado ajuizou processo reivindicando o direito de comprá-lo. E
assim foi ganhando tempo, enquanto a Justiça lhe negava o direito de aquisição.
O Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal já rejeitaram seu
pedido diversas vezes, mas ele continua recorrendo por meio de embargos.
Valor de mercado
Uma enfermeira aposentada do HFA que mora em outra unidade
funcional do Bloco B da SQN 114 desde 1981 não paga o condomínio há mais de uma
década. O prédio cobra judicialmente da União débitos que hoje totalizam cerca
de R$ 120 mil. Mara Tonheca entrou na Justiça em 1998 alegando direito de
compra. Em 2004, obteve decisão favorável para adquirir o imóvel por R$ 345
mil, mas não o exerceu na época, alegando impossibilidade por estar doente. A
Justiça manteve seu direito em 2006, mas a União exigiu o preço de mercado
naquele ano, de R$ 691 mil. Hoje, o imóvel vale R$ 1,5 milhão.
A servidora contestou o novo valor e ofereceu pagar somente
os R$ 345 mil atualizados monetariamente. Ela ganhou novamente, mas a União
recorreu por meio de agravo de instrumento, que está para julgamento no
Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
Edilce Rodrigues, advogada da enfermeira, afirmou que para
adquirir o imóvel ela precisará da declaração do condomínio de quitação dos
débitos exigida pela Caixa Econômica Federal para financiar a compra,
sinalizando eventual pagamento da dívida. Mas não garantiu que ela terá
interesse ou condições de comprar o imóvel, cujo valor de R$ 345 mil atualizado
está em R$ 500 mil.
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