Valor Econômico - 19/05/2014
Editorial
A emenda constitucional 19, de 1998, promoveu uma profunda
reforma na administração pública brasileira. Entre outras coisas, introduziu o
termo "subsídio" para determinadas categorias de agentes públicos, em
substituição aos termos remuneração e vencimentos, e definiu um teto único de
remuneração para os três poderes da República e para todos os entes federados
(União, Estados, Distrito Federal e municípios). Estabeleceu também que o
subsídio teria parcela única, à qual não pode ser acrescida qualquer gratificação,
adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie
remuneratória.
Com isso, o legislador pretendeu acabar com todas as
distorções então existentes, quando a remuneração do servidor compreendia um
valor fixo mais as vantagens pecuniárias de diversas naturezas. Havia
adicionais e vantagens de todos os tipos, o que levava o administrador público
a conviver com um verdadeiro caos remuneratório.
Não havia transparência, pois os contracheques dos agentes públicos eram recheados de itens que se referiam a dispositivos legais específicos, quase impossíveis de serem entendidos. Ainda não caiu no esquecimento os famosos "marajás" do serviço público, que, por contas de vantagens e adicionais, conseguiam valores em seus contracheques que, depois de conhecidos, chocaram a Nação.
Não havia transparência, pois os contracheques dos agentes públicos eram recheados de itens que se referiam a dispositivos legais específicos, quase impossíveis de serem entendidos. Ainda não caiu no esquecimento os famosos "marajás" do serviço público, que, por contas de vantagens e adicionais, conseguiam valores em seus contracheques que, depois de conhecidos, chocaram a Nação.
Esse "caos remuneratório" levou as administrações
públicas das três esferas da Federação a gastar muito acima do razoável,
algumas delas comprometendo quase toda a sua receita com o pagamento de
pessoal. Assim, além de procurar dar maior racionalidade à política de
remuneração dos agentes públicos, o legislador procurou, com a emenda
constitucional 19, facilitar o controle do administrador público sobre a folha
de pessoal. São da mesma época as iniciativas para se estabelecer limites para
a despesa com a folha de pagamento. Esses limites foram fixados para os três
poderes e para a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios.
Na quarta-feira passada, o Valor revelou que está para ser
votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado uma proposta de
emenda constitucional que cria um adicional por tempo de serviço para toda a
magistratura e para os membros do Ministério Público. Os juízes, os promotores
e os procuradores da República, dos Estados e do Distrito Federal terão direito
a 5% de aumento a cada cinco anos, até o limite de 35%. O benefício será
estendido aos aposentados e pensionistas. Esse adicional tinha sido extinto
pela reforma administrativa.
A PEC nº 63/2013 prevê ainda que a vantagem a ser criada
para os juízes e os membros do Ministério Público não será computada para
efeito do cálculo do teto salarial do funcionalismo. Ou seja, se aprovada, os
juízes e procuradores serão autorizados a "furar" o teto, instituído
pela emenda constitucional 19. Ela terá efeito retroativo, pois assegura a
contagem do tempo de exercício anterior à data da publicação da PEC para fins
de cálculo da parcela mensal a ser paga.
O Valor noticiou também, e isso é o mais grave, que a PEC
está sendo apoiada abertamente por todo o Judiciário. Em 22 de abril deste ano,
o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) endossou o teor da PEC 63, aprovando uma
nota técnica, assinada pelo ministro Francisco Falcão, que defende "a criação
de parcela mensal em retribuição pelo tempo de serviço como forma de garantir a
permanência e estimular o crescimento profissional na carreira". O
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, que não
participou da reunião do CNJ, disse, em nota ao Senado, que a PEC 63
"imprime efetividade às ações de valorização da carreira percorrida pela
magistratura".
A PEC foi endossada também pelo presidente do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), ministro Félix Fischer, pela presidente do Conselho
Nacional de Procuradores Gerais (DNPG), Eunice Carvalhido, e por presidentes de
tribunais regionais e trabalhistas.
O único voto contrário à proposta na CCJ, até agora, foi o
do senador Eduardo Suplicy (PT-SP). Para ele, ao abrir exceção específica para
magistrados e membros do Ministério Público, a PEC fere de morte o princípio da
isonomia. Outras categorias de servidores irão reivindicar o mesmo benefício. E
assim, como lembrou Suplicy, o dique que foi construído para conter a elevação
dessas despesas será rompido, com consequências graves para as finanças
públicas.